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A ALOPECIA E A BUSCA POR RECONHECIMENTO


No final do Século XIV, a rainha Isabel da Baviera se tornou modelo de uma moda, que hoje seria considerada “esquisita”: a testa alta. Para satisfazer os padrões de beleza, as mulheres raspavam o cabelo acima da testa e em muitos casos retiravam as sobrancelhas. Nem os cílios eram poupados: algumas vezes retiravam tanto os cílios de cima como os de baixo.

 

A testa alta era sinal de inteligência, status e nobreza na Idade Média.

Escritores e poetas elogiavam essas testas reforçando o símbolo de elegância e poder.

 

A Alopecia é a testa alta do presente. Considerada por especialistas como resultado de doença autoimune, é caracterizada por perda extrema de cabelos. A queda dos pelos seria provocada por uso de medicamentos, micose, estresse, produtos químicos, problemas na tireoide, deficiências de proteínas e de alguns elementos. Ou seja, a vida moderna industrializada seria a causa. Essa é a visão da ciência cartesiana, aceita e acolhida pela comunidade médica. Mas o que não se fala é que ela pode ser algo mais profundo, de origem distante, como um recurso do corpo para recuperar a autoestima de outros tempos, por mais surpreendente que pareça.

 

A Alopecia pode ser uma viagem do corpo ao passado como forma de recuperar status, elegância e respeito de tempos antigos. O corpo carrega memorias profundas e as resgata quando no presente há um pedido de socorro emocional. A testa alta retoma então seu lugar como marca de respeito assim como as sobrancelhas raspadas e redesenhadas.

 

SOBRANCELHAS

 

Na Grécia Antiga era moda ter “monocelha”. Se uma mulher não nascesse com essa característica, ela poderia esfregar carvão entre as sobrancelhas ou até fazer um “implante” com pelo de cabra. Hoje as sobrancelhas que antes eram depiladas, voltaram a ser ampliadas e valorizadas com implantes permanentes, tal como na antiguidade.

 

Habitantes da China Medieval foram ainda mais longe: por volta dos séculos II-III, a moda era ter sobrancelhas coloridas. Um dos imperadores da época ordenou que suas esposas tivessem sobrancelhas na cor azul-esverdeada. Para acatar o pedido do marido, as mulheres raspavam as sobrancelhas e, então, as desenhavam com tintas coloridas caras, trazidas de fora da China. Isso não só agradava aos olhos do imperador, como também mostrava aos súditos o quão próspero ele era, pois somente pessoas muito ricas poderiam se dar ao luxo de comprar tintas estrangeiras. Vale destacar que os formatos variavam desde as curtas e finas às longas e grossas, como hoje.

 

NOS HOMENS, PUREZA RACIAL E FORÇA

 

Nos homens a dermatite seborreica e até a ansiedade podem ser causas da Alopecia Androgenética, a calvice. Mas também podem ter origens mórficas, o acesso do corpo às memórias profundas de pureza racial e força. Em muitas culturas e períodos da história, a calvice foi reverenciada desde o antigo Egito até o povo Issini (atual Gana), no século 18. Cabeça raspada era sinal de poder e força. Era também símbolo de pureza, rejeição às superficialidades e resultado de rituais de iniciação – raspagens diárias.


Cabeças calvas também foram associadas às divindades, vida monástica de budistas e freiras católicas. A partir do século 19, no Ocidente, passou a ser associada a ideias (preconceituosas) de inteligência e raça superior. Os homens sem cabelo são os intelectuais: sua força mental e corporal são consideráveis, o cérebro dos calvos domina a matéria, escreveu em 1891 o inglês Henry Frith, em seu livro How to Read Character in Features, Forms and Faces (Como interpretar características em fisionomias, formas e faces). As raças brancas e sem cabelo dominam o mundo sobre as raças com cabelo, definiu Frith.


Estudantes de medicina dos EUA aprenderam que “escravos, índios, mulheres e pessoas burras nunca ficam carecas por causa dos cérebros pequenos e subdesenvolvidos”.  O médico David Walsh, dos EUA, defendeu em livro sobre doenças capilares que “a calvice é praticamente desconhecida entre os selvagens”. Essa lógica eugenista permaneceu inalterada até o século XX. Em 1966, o dermatologista americano Ian Martin-Scott concluiu que nas raças de cor a calvice é uma raridade e praticamente desconhecida entre os semicivilizados.


Hoje a cabeça raspada é uma das marcas de grupos neonazistas e supremacistas brancos. Do ponto de vista sistêmico, não está descartada a possibilidade de casos de alopecia em homens também ser uma forma de valorização e resgate de poder. Seria o que dermatologistas chamam de “causas emocionais” para queda de cabelos. Fato é que o corpo humano é, ainda hoje, um grandessíssimo mistério.


Arthur

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